Monday, December 17, 2012
Teresa cansada
Teresa estava cansada muito cansada. A casa tinha sido ocupada nos últimos
dias e não existia um só lugar que não houvesse sido devassado por visitantes.
O ritmo das tosses marcava o compasso das intermináveis horas de espera.
Moribundos são assim, tem o espetáculo anunciado , marcham direto para o
desfecho mas adoram saborear o domínio da situação e tal como um chefe de seção
nos fazem esperar longas horas nos sofás da espera. Então as gentes fumam e
conversam e suspiram e temem também pelo seu momento, que deverá chegar um dia
se deus quiser daqui a muito tempo. E no olho do furacão Teresa disfarça o
cansaço e distribui gêneros e ditados e se movimenta o tempo todo ostentando
papel de capitão do navio seguro da rota e lá vai Teresa providenciar mais café
e cuidados para todos. Em momentos estratégicos
ela exerce o supremo direito de entrar no aposento onde Rui
Mauro se esvai lentamente quase virado em sopro mas que teimosamente se mantém
preso ao lado de cá com seus grandes olhos agora maiores do que tudo já prestes
a conhecer toda a verdade ou uns cinco por cento, o que dá no mesmo. Ainda faz
sinais e com muito esforço poderá ainda dizer algo importante e por isto Teresa
não se permite ficar longe muito tempo,claro que a menina está vigiando de olhos bem atentos mas não é bom
confiar nos outros mesmo que seja nessa menina velha que cumpre todas as
coisas pedidas como se fossem um ritual sagrado e agora tem barulho
demais na sala ,será que esta gente perdeu a noção das coisas? deve ser por
causa da tv que deixa todo mundo louco onde é que já se viu faltar o respeito
numa hora dessas? Fala um daqui a pouco eu volto e pelo amor de deus avisa
qualquer alteração com o doente e lá vai Teresa mais cansada ainda disfarçar
seu cansaço em eficiência e altivez de espírito. Rui Mauro acompanha tudo como
se fosse no cinema, como se tivesse bebido muito e ido ao cinema, com um pouco
de febre também e então os personagens e ambiente mudam o tempo todo e tudo
parece confuso demais a princípio mas o tempo passa e gente vai
acostumando e até gosta e seria de rir saber que estar moribundo nem é tão ruim
assim apesar de ser o fim. O pensamento compensa a inércia do corpo e já ensaia
a liberdade da alma e voa e voa cada vez mais alto e longe, brincando de
visitar pessoas e lugares já muito remotos, quase improváveis e a medida que
assume o controle da nova situação Rui Mauro se diverte misturando personagens
da infância, velhos romances e parentes queridos numa ciranda cada vez mais
alucinada e que contrasta com o corpo pálido, desfeito em suor e miasmas, a
pele convertida em cera mergulhada nos vapores de um quarto quase mortuário e
aquela menina velha pavorosa que é melhor não ver com seu olhos fixos
encarnados na missão de assinalar a hora final da passagem e onde diabos afinal
anda Teresa que é a única coisa boa do lado de fora desta minha morte tão comprida
e ,quando não dá pra brincar, tão chata. Meu deus alguém bem que podia abrir a janela e despachar
esta menina velha para Manaus, ai Teresa onde você anda!
E Teresa agora recebe mais gente e comanda novos grupos, porém
sempre com a cabeça dentro do quarto vigiando e esperando se Rui precisar algo
e então sente uma campainha chamar com desespero e tudo ao redor congela e
corre rápido para o quarto onde Rui agora faz um esforço muito grande porque
seu vôo delirante foi interrompido por uma necessidade urgente de fazer um
pedido acompanhado de um medo enorme de não conseguir mais falar- afinal quanto
tempo faz da ultima vez? - justo agora que seria fundamental e meu deus não
permita que eu parta sem deixar algo tão importante sem resolver .
- por favor venham palavras! minhas últimas palavras não me faltem pelo
amor de deus e venha você Teresa também, que não a de ser pra esta menina velha
horrorosa que eu vou deixar este pedido crucial e pelo amor de deus Teresa
entendeu o chamado, deve ser porque o clima da casa criou uma enorme energia
estática e assim foi que cruzando os ares densos da casa Teresa entrou no
quarto que já era quase só o olhar gigantesco do Rui Mauro que pedia sua
proximidade e mal deu tempo pra expulsar a menina velha pra sala, posto que a morte como qualquer necessidade
fisiológica deve ser íntima, em
seguida encostou o rosto na máscara do Rui que num esforço de trem subindo
montanha mal pode dizer: Pelo amor... Deus......não deixa.....hipótese..nenhuma....................................................não
.... em caso algum...............-.e num arranque quase como um grito com mínimo volume - Teresa! não
deixa de jeito nenhum o Monza nas mãos do Adilson!!! e daí olhou
com os olhos imensos pro nada onde sentava um minuto atrás a menina velha
horrorosa.
Então descansaram os dois, cada um do seu lado do muro.
Saturday, December 01, 2012
Imaginárias
Fazendo arrumação de fim de ano achei uma pasta interessante, coletânea de alguns desenhos feitos em épocas e materiais muito diversos mas que o "eu" arquivista que também me habita achou por bem reunir sob o título de imaginárias. Faz algum sentido.